segunda-feira, 27 de abril de 2009

Método do sapato



Eu minto pra mim mesmo.

Finjo que tudo é diferente, que é tudo melhor.

E tenho pena dos que são obrigados a simplesmente aceitar essa merda de realidade.

Vivo uma realidade diferente. A minha realidade. Meu mundo.

Não é como se vivesse uma mentira. É mais como uma realidade alternativa.


Também posso fingir que está tudo pior.

Assim de repente volto pra vida real, e ela parece boa se comparada a minha realidade.

Tipo quando deixava a minha horrenda e falhada barba crescer bastante só pra me sentir mais bonito após raspar.


Eu chamo isso de Método do Sapato. E explico:

Minha vida era um saco.

Tudo repetitivo. Odiava aquilo, mas não havia solução.

Eu precisava daquela merda de emprego. Eu precisava daquele cotidiano.

Então comprei um par de sapatos. Bem apertados. E o usava todo dia.

Depois de um dia inteiro aturando os desaforos do meu ofício, e a dor absurda do sapato, chegava em casa e me descalçava.

O mundo, nesse momento, parecia lindo.

Então dormia como um bebê, e tinha lindos sonhos.


Hoje não uso mais sapatos apertados.

Apenas minto pra mim.

E tomo Gardenal.


(por Zé Mingau)

segunda-feira, 13 de abril de 2009

Mais feliz que os poetas


“Sozinho?”. Todo mundo perguntou isso. Sim, sozinho, oras! Qual o problema? O que tem de estranho nisso?
Como assim “o que você vai fazer na praia sozinho”? O que se faz numa praia, droga?
Ta bom, eu sei. Eu não gosto de praia, admito.
Mas fui pra lá andar. Caminhar ao lado do mar.

Num tem nada a ver com coisa de corno ou fossa!
É quase como um poeta, sabe?
Como o Carlos Drummond de Andrade, em Copacabana, ou Edgar Allan Poe num cemitério, sei lá.
Acho que a única diferença entre eu e os poetas é que eu não sei fazer poesia. Detalhe que eu ignoro.
Na verdade não é que eu não saiba fazer poesias.
É que eu ando por lugares belos, os contemplo, e é uma sensação perfeita.
Então eu canalizo todo esse bem estar e guardo só pra mim, diferente dos tolos poetas que o dividem com os outros, em suas poesias.
Acho então que posso dizer que sou mais feliz que os poetas.


(Por Zé Mingau)