sábado, 16 de maio de 2009

Incapacidade



Fui atravessar a rua e quase fui atropelado por um motorista retardado que não ligou a seta antes de virar a esquina.
Ele parou pouco a frente do ponto onde quase me atropelou.
Eu parei também e olhei pra ele, ainda com um pouco de esperança de ouvir um pedido de desculpa. Ele gritou um palavrão e me chamou de viado.
Não conseguiria mensurar o ódio que senti naquele momento.
Primeiro pelo incidente que poderia ter um final pior, depois pela minha incapacidade de fazer qualquer coisa.
Na hora, várias possibilidades me passaram pela cabeça: podia ter ido lá, e espancado o cara, mas não me garanto o suficiente, então reprovei. Podia ter xingado de volta, mas apenas isso não ia me fazer sentir melhor. Reprovei também. Podia tê-lo processado por me chamar de viado, mas não ia dar em nada. Porque sou hétero. Só viados tem o direito de processar por serem chamados de viados, o que não faz o mínimo sentido pra mim. Eu só posso processar se alguém me chamar de hétero? As possibilidades de alguém quase me atropelar e gritar “SEU MACHO!” são nulas. Isso reprova também a idéia do processo.
Tive raiva de mim também.
Cheguei ao ponto de pensar “Devia ter ficado na frente do carro.
Faria um estrago no capô e ainda sujaria o pára-brisa todo de sangue. Hahá!”


(por Zé Mingau)